Esclerose múltipla: entenda tudo sobre isso (2023)

Eu sou o Doutor Francinaldo Gomes, médico neurocirurgião, especialista em neuromodulação, epilepsia e cannabis medicinal, e neste artigo irei esclarecer as suas dúvidas sobre a Esclerose Multipla.

Você está praticando exercícios físicos na companhia da sua irmã, agora com 25 anos de idade, ao olhar para você, refere que a vista ficou embaçada. 

Vocês então decidem retornar para casa e descansar.

Cerca de 24 horas depois, ao tentar se levantar, ela percebe que não consegue coordenar os movimentos das pernas, necessitando de ajuda para se locomover. Ela também está com dificuldade para urinar.

Cerca de um mês antes ela havia apresentado dormência abrupta no lado direito do corpo, após um quadro de estresse emocional, desencadeado pelo término do namoro.

Na época foi a uma emergência, ela foi avaliada porém foi liberada com diagnóstico de transtorno conversivo, vulgarmente conhecido como Peach, e recebeu orientação para procurar tratamento e acompanhamento psiquiátrico.

Associada ao quadro atual, ela refere também dor de cabeça e dificuldade para engolir os alimentos. 

Você então preocupado com o estado atual da sua irmã decide levá-la ao médico e após uma minuciosa avaliação e realização de exames você é informado de que ela teve uma crise de esclerose múltipla. 

O que é esclerose múltipla?

A esclerose múltipla é uma doença neurológica desmielinizante, autoimune e crônica. 

Provocada por inflamação e degeneração, que comprometem a bainha de mielina, que é uma estrutura que reveste os neurônios do sistema nervoso. 

Alguns locais no sistema nervoso podem ser alvos preferenciais desse processo, que é uma característica da doença. O que explica o porquê os sintomas mais frequentes ocorrem em regiões diferentes do cérebro, daí o nome esclerose múltipla. 

As regiões mais afetadas são principalmente o tronco cerebral, os nervos ópticos e a medula espinhal. 

A prevalência e a incidência de esclerose múltipla no mundo variam de acordo com a geografia e com as características étnicas, havendo taxas de prevalência variando de 2 por 100 mil habitantes na Ásia. E mais de 100 por 100 mil habitantes na Europa e na América do Norte. 

No Brasil estima-se que existam cerca de 40 mil pessoas com esclerose múltipla, uma prevalência média de 15 pessoas por 100 mil habitantes, conforme a última atualização da Federação Internacional de Esclerose Múltipla e da Organização Mundial de Saúde, que foi publicada em 2013.

O número estimado de pessoas com esclerose múltipla no mundo aumentou de 2,1 Milhões em 2008 para cerca de 2,3 milhões em 2013

Geralmente, a doença atinge pessoas jovens, com idade média entre 20 e 40 anos,  predominando entre as mulheres. 

Esclerose Múltipla: Conheça Tudo sobre a Doença! Sintomas, causas e tratamentos.

Esclerose múltipla: Causa

As causas envolvem uma predisposição genética, com alguns genes já identificados que regulam o sistema imunológico e uma combinação de fatores ambientais que funcionam como gatilhos, dentre eles:  

  • Infecções virais
  • Exposição ao sol e consequente níveis baixos de vitamina D
  • Exposição prolongada ao tabagismo 
  • Obesidade 
  • Exposição a solventes orgânicos 

Estes fatores ambientais são considerados na fase da adolescência, que costuma ser um período de maior vulnerabilidade.

Nas pessoas que têm esclerose múltipla as células imunológicas invertem o seu papel, ao invés de protegerem o sistema de defesa do indivíduo passam a agredi-lo,  produzindo inflamações.

As inflamações afetam particularmente a bainha de mielina, que é uma capa protetora que reveste os prolongamentos dos neurônios, denominados axônios. 

Na qual são responsáveis por conduzir os impulsos elétricos do sistema nervoso central para o restante do corpo e vice-versa. 

Com a mielina e os axônios lesionados pelas inflamações, as funções coordenadas pelo cérebro e pelas estruturas que coordenam principalmente os movimentos e a  sensibilidade, ficam comprometidas. 

Desta forma surgem os sintomas típicos da doença como: 

  • Alterações na visão;
  • Na sensibilidade do corpo;
  • Alterações no equilíbrio;
  • No controle das funções esfincterianas;
  • Na força muscular dos membros, com consequente redução da mobilidade e da locomoção;

Os surtos de esclerose múltipla também chamados de surtos de desmielinização, ocorrem a partir do surgimento de um novo sintoma neurológico, ou quando ocorre piora significativa de um sintoma antigo, com duração de pelo menos 24 horas.

Para ser considerado um novo surto é necessário que ocorra o intervalo mínimo de 30 dias entre eles, caso contrário considera-se o sintoma como sendo do mesmo susto, só que em andamento.

A recuperação dos ataques destas inflamações, chamadas de surtos, pode ser total ou parcial, e quando é parcial costuma haver a remielinização.

O quadro clínico de cada surto é variável e pode apresentar mais de um sintoma, algumas pessoas apresentam piora dos sintomas na ocorrência:

  • Febre ou infecções
  • No frio extremo ou  no calor
  • Durante a prática de exercício físicos
  • Em períodos de desidratação 
  • Variações hormonais
  • Estresse emocional 

Em geral essas situações costumam ser transitórias. 

Atenção especial às infecções, pois elas costumam agravar os sintomas da pessoa com esclerose múltipla, desencadeando sintomas que podem ser considerados surtos, mas nestas situações é considerado como falso ou pseudo surto.

Esclerose múltipla: Sintomas  

Os sinais da esclerose múltipla e seus sintomas mais comuns são:

  • Fadiga 
  • Fraqueza 
  • Cansaço 
  • Alterações na sensibilidade, como dormência e formigamentos 
  • A neuralgia do trigêmeo, que é a dor que acomete um lado do rosto 

Sintomas visuais decorrentes da inflamação do nervo óptico, como a visão borrada, mancha escura no centro da visão de um olho, embaçamento ou mesmo perda visual. Visão dupla também pode ocorrer. 

Sintomas motores da esclerose múltipla como: perda da força muscular, dificuldade para andar, espasmos e rigidez na musculatura. 

Sintomas relacionados ao equilíbrio como: a falta de coordenação dos movimentos ou para andar, tonturas e desequilíbrios que também costumam ocorrer. 

Sintomas esfincterianos como: dificuldade para controlar a bexiga, seja para retenção de urina ou mesmo para perda involuntária, ou também dificuldade para controlar os intestinos. 

Sintomas cognitivos como: problemas de memória e atenção do processamento das informações. E problemas mentais como: alteração de humor, depressão e ansiedade. 

As falhas de memoria e alterações no humor, também podem ser sintomas de Alzheimer, e recomendamos procurar um neurocirurgião de sua confiança.

Formas clínicas de esclerose múltipla

Existem basicamente quatro formas da esclerose múltipla se manifestar: a forma remitente recorrente, a secundária progressiva, primária progressiva e a última chamada progressiva com surtos. 

A primeira forma de esclerose múltipla chamada de surto remissão ou remitente recorrente abrange cerca de 85% das pessoas.

Ela é caracterizada pela ocorrência dos surtos e melhora após o tratamento, ou até mesmo a melhora espontânea pode ocorrer.

Geralmente ocorre nos primeiros anos da doença, com recuperação completa e sem sequelas. 

Os surtos duram dias ou mesmo semanas, em média eles se repetem uma vez por ano caso não seja feito o tratamento adequado

Aproximadamente, em um prazo de cerca de 10 anos, metade das pessoas irá evoluir para a segunda forma da doença conhecida como secundária progressiva.  

Nesta etapa as pessoas não se recuperam mais plenamente dos surtos e começam a acumular sequelas. 

Por exemplo, essas pessoas têm uma perda visual definitiva ou maior dificuldade para andar, o que pode levar a necessidade de auxílio para se movimentarem em suas atividades, com apoio de bengala ou mesmo de cadeiras de rodas.

Nos 10% das pessoas restantes ocorre a chamada a forma progressiva primária quando ocorre piora gradativa, surto após surto 

Em 5% das pessoas ocorre a quarta forma da doença, mais rápida e agressiva chamada progressiva com surtos. 

Nesta quarta estão combinados a progressão paralela do processo de desmielinização e comprometimento mais precoce dos neurônios

Diagnóstico

São utilizados os critérios de McDonald ‘s, desde 2017, que consideram vários aspectos clínicos e de imagem associados a análise do líquido cefalorraquidiano, como a pesquisa de marcadores específicos.

A ressonância magnética de crânio e da coluna é a principal ferramenta para o diagnóstico das doenças desmielinizantes do sistema nervoso central, particularmente da esclerose múltipla. 

Na ressonância magnética, as lesões da desmielinização, típicas da esclerose múltipla, têm que preencher critérios radiológicos de disseminação no tempo e no espaço.

O próximo exame necessário para o diagnóstico de esclerose múltipla é a análise do líquido cefalorraquidiano, que é extraído por meio da punção da coluna lombar. Ele auxilia na confirmação da esclerose múltipla.

A pesquisa de bandas oligoclonais no líquido cefalorraquidiano e sua interpretação, são de extrema importância na investigação diagnóstica da esclerose múltipla.

Outros exames complementares podem ser solicitados pelo médico como: 

  • Potenciais evocados visuais
  • Potencial evocado somato sensitivo dos membros superiores e inferiores
  • Potencial evocado auditivo do tronco cerebral, que são chamados exames neurofisiológicos 

Eles são úteis para compreensão do comprometimento das funções e também como parâmetros de resposta ao tratamento.

O diagnóstico precoce da esclerose múltipla faz toda a diferença para o sucesso no tratamento. 

Quanto mais cedo o tratamento for iniciado, maior a chance de se modificar o curso natural da doença no longo prazo. Reduzindo o número de surtos, a quantidade de lesões e as sequelas neurológicas. 

Esclerose Múltipla: Tratamento 

Ainda não existe cura para a esclerose múltipla, mas existe o tratamento e quanto mais cedo ele começar, melhor a qualidade de vida que a pessoa pode ter. 

Veja alguns tratamentos de esclerose múltipla:

Uso de medicamentos corticoides

Esses medicamentos ajudam a inibir a ação do sistema imunológico, geralmente são administrados por curtos períodos para amenizar os sintomas como: a perda de visão, força ou mesmo da coordenação. 

Os corticoides podem ser dados por via oral ou podem ser diretamente na veia, de acordo com a necessidade de cada caso. 

Existem também medicamentos para o controle do sistema imunológico, na qual dificultam o ataque das células de defesa à bainha de mielina e ajudam também a evitar as crises. 

Apenas o médico assistente é capaz de definir o tipo de tratamento mais adequado para cada pessoa, mas existem hábitos e práticas que podem amenizar os sintomas da esclerose múltipla tais como: exercícios físicos, pedalar, caminhar,nadar e se alongar, que ajudam na saúde cardiovascular, muscular e psicológica . 

Fisioterapia

Melhora o equilíbrio, a capacidade de caminhar e o nível de mobilidade. 

Procure caminhar sozinho sempre que puder, isso ajuda na sua qualidade de vida e evita distúrbios emocionais, como a depressão. 

É muito importante consultar um médico antes de começar qualquer tipo de exercício físico, ele deve orientar quais os tipos de exercícios e também se há algum impedimento, além de orientar sobre a frequência e a intensidade deles

Isso evita o surgimento de outros problemas e até mesmo o agravamento de algum sinal ou sintoma da doença. 

Canabidiol

Ao longo dos últimos anos tem havido uma revolução com novos tratamentos para o controle da doença. 

Um dos medicamentos com grande potencial de efeito terapêutico satisfatório é o canabidiol, um dos derivados da cannabis. 

Ele tem mostrado efeitos benéficos, tanto na evolução da doença, quanto no controle de alguns sintomas. 

E também para o tratamento da dor crônica, que costuma ocorrer em pessoas que têm esclerose múltipla, por exemplo.

Além do tratamento farmacológico habitual, o uso dos derivados da cannabis, incluindo TCH, tem mostrado efeito benéfico. 

Entretanto, mais estudos são necessários para que se possa definir adequadamente o tratamento com os derivados da cannabis. 

Para algumas pessoas que têm sequelas da esclerose múltipla, também pode ser necessário o tratamento cirúrgico por meio da neuromodulação, algo que deve ser feito por um médico especialista nesta área. 

Por enquanto nenhum dos tratamentos são curativos, e temos visto pouca evolução em medicamentos que tratam os sintomas causados pela esclerose múltipla. 

Tratamentos alternativos para a esclerose múltipla 

Naturalmente muitas pessoas procuram tratamentos alternativos e complementares, tais como o uso da cannabis. 

Pesquisas recentes indicam que componentes encontrados na cannabis sativa, como o canabidiol, por exemplo, podem ser importantes aliados na garantia da qualidade de vida da pessoa com esclerose múltipla. 

Dentre os principais benefícios da cannabis medicinal para pessoas com esclerose múltipla estão

  • A desaceleração do processo neurodegenerativo 
  • A neurorregeneração 
  • E a limitação da progressão da doença 

Já que o canabidiol possui propriedades anti-inflamatórias. 

Além disso, possui efeito analgésico em pessoas com dores neuropáticas, que podem ocorrer em pessoas que têm esclerose múltipla. E mais ainda, ele costuma ter um efeito benéfico no humor, reduzindo os quadros de depressão.

Outro efeito benéfico dos derivados da cannabis é o controle da espasticidade muscular. 

Neste caso, as pessoas que têm esclerose múltipla costumam usar, além do cbd que o canabidiol, o tch que é um composto psicoativo da cannabis e eles tem mostrado excelentes resultados no controle da espasticidade.

Evolução dos pacientes que têm esclerose múltipla 

Apesar de não haver ainda cura, a pessoa com esclerose múltipla pode sim viver bem e ter qualidade de vida. 

Embora a doença costume persistir por toda vida, seu curso pode ser melhorado com ajuda de opções terapêuticas, medicamentos, apoio psicológico adequado,  apoio de uma equipe multidisciplinar. E principalmente com o apoio dos familiares e cuidadores, dando suporte necessário, para que a pessoa com esclerose múltipla possa fazer o tratamento correto e ter qualidade de vida 

Para concluir…

A esclerose múltipla constitui uma doença neurológica pouco comum, mas que impacta negativamente a qualidade de vida da pessoa. 

Existem muitos fatores que podem estar relacionados com a esclerose múltipla, mas a causa ainda não foi bem determinada. 

Apesar de não haver cura, com acompanhamento médico, o tratamento multidisciplinar deve ser feito o mais precocemente possível, para que a pessoa com esclerose múltipla possa obter o controle da sua doença e ter qualidade de vida. 

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